O campo de trigo
Dom Pedro José Conti, Bispo de Macapá
Um
rapaz caminhava, junto ao seu avô, por uma vereda que beirava um
extenso campo de trigo. O menino ficou encantado com aquele mar dourado.
Chegando mais perto, viu que algumas espigas eram tão dobradas para
baixo que quase tocavam no chão. Outras, ao contrário, estavam bem
retas, erguidas para o céu. Não encontrando a explicação daquela
diferença, quis saber do avô o porquê.
O idoso juntou duas espigas uma dobrada e outra erguida. Debulhou na mão a primeira e disse:
-
Estás vendo? Aquela encurvada está cheia de frutos. Depois quis fazer o
mesmo com a segunda, mas na sua mão ficou somente a palha.
-
Esta está vazia – afirmou o avô, e concluiu: - Meu filho, muitas vezes
acontece o mesmo entre os homens: as cabeças ocas se erguem
orgulhosamente acima das outras.
Uma
história simples vinda daquelas regiões do planeta onde é comum ver, no
verão, grandes extensões de trigo maduro. As espigas amarelas ondulam
com o vento. Parece mesmo um mar da cor do ouro. Uma visão, semelhante a
esta, promissora de boa colheita, deve ter inspirado Jesus quando
contou a parábola do joio e do trigo, a primeira que encontramos no
evangelho deste domingo.
Acompanhando
a parábola, porém, descobrimos que aquela beleza estava deturpada pela
presença ameaçadora da erva daninha. A boa semente, plantada pelo dono,
estava dando os seus frutos, mas um inimigo, às escondidas, tinha
semeado o joio que também tinha brotado. A vontade dos trabalhadores era
arrancar o joio, para que não prejudicasse o crescimento do trigo. Não
seria um trabalho fácil, mas permitir que o joio crescesse junto ao
trigo, não entrava na lógica deles. Surpreendentemente, no entanto, o
dono do campo mandou esperar. Arrancando o joio, podiam arrancar também o
trigo. Somente na hora da colheita será feita a separação entre a erva
daninha, destinada ao fogo, e o trigo, pronto para ser armazenado nos
celeiros. Precisava esperar.
As
parábolas de Jesus, mais que dar conselhos e soluções, levam-nos a
questionamentos e escolhas. Se, para começar, identificamos o trigo com o
bem e o joio com o mal, devemos admitir que eles crescem juntos ao
longo da história da humanidade. Além disso, as coisas erradas, os
escândalos, os sofrimentos e as dificuldades chamam mais atenção.
Podemos ser tentados a pensar que tomem conta de tudo. Não é verdade. O
bem, a bondade e a honestidade são mais comuns do que pensamos. Acredito
que façam parte da nossa vida, no dia a dia, quase sem perceber. A
grande maioria das pessoas se não é um espelho de bondade, também não é
um monstro de maldade. Passa com o sinal fechado, quando não vem
ninguém, e dá uma esmola às pressas, quase com vergonha de ser pego num
flagrante de generosidade. Se não fosse assim, a humanidade já teria
destruído a si mesma com as suas próprias mãos.
O
tempo da espera até a colheita é, me parece, o tempo da provação,
durante o qual o trigo - o bem - nunca desiste de crescer e nem se
confunde com o joio - o mal. O Reino dos céus, quer nos ensinar Jesus,
não é algo de pré-determinado, onde tudo é fácil e imediato. O Reino é
questão de perseverança, vontade, mas também de paciência, resistência,
confiança. O bem deve continuar a crescer, apesar do mal que também
cresce ao seu lado. Não pode se deixar sufocar pelo desânimo ou pela
demora da colheita. É na luta do dia a dia que se vence a batalha. Um
sorriso em resposta a uma ofensa, uma palavra de carinho em troca de uma
desafeto, um agradecimento que derrota a indiferença. Os frutos da
natureza crescem no silêncio, assim também acontece com o bem. Não faz
barulho porque não muda apenas as aparências, transforma, aos poucos, os
corações.
Da
mesma forma, os frutos melhores são as obras de caridade, de quem,
humildemente, se dobra para ajudar o irmão sofrido. Nunca são os frutos
dos orgulhosos que gostam de aparecer, mas pouco ou nada fazem de
verdade. Esses são espigas, sim, mas vazias. Joio disfarçado de trigo.
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