Reenvio matéria do colega Emanoel Reis
Caso “Maternidade Mãe Luzia”
Publicado em 04/05/2010 por emanoelreis
A estratégia é desqualificar a reportagem do Fantástico
“Sofistas de aluguel” estão empenhados em encobrir a verdade
É incrível, mas há quem esteja trabalhando intensamente nos bastidores para que não se comente mais sobre a reportagem exibida pela TV Globo, no Fantástico de domingo, 2 de maio, que tratou das mortes de recém-nascidos na Maternidade Mãe Luzia. Inclusive, radialistas estão afirmando que a reportagem do Fantástico exagerou “e que em alguns trechos a verdade foi omitida”, que mostrou “apenas” o aspecto negativo do Amapá, que poderia ter sido diferente.
Um desses locutores, até recentemente contemplado pelo governo estadual com cerca de R$ 6 mil/mês pagos por uma agência de publicidade que prestava serviço para o ex-governador Waldez Góes, lançou mão de um estratagema mais do que antiquado, porém, ainda funcional, o de confundir o ouvinte/leitor. Ou seja, a manobra consiste em reduzir a importância do assunto tratado com base no silogismo erístico. Trata-se de uma falácia , um argumento construído sobre falsas verdades. Em bom português é o seguinte: embora o sujeito saiba que determinado assunto é verdadeiro, que realmente vem acontecendo (como é o caso da Maternidade Mãe Luzia), sub-repticiamente ele desconstrói aquela verdade com os seguintes argumentos:
“Há muito tempo a maternidade não passa por ampla reforma”
“Atende mais do que sua capacidade permite”
“Ela vive superlotada. Seus pacientes são do Amapá, e, também do Pará”
“Os equipamentos estão obsoletos”
“Há poucos médicos”
“Faltam medicamentos”
“Tem gente que adora ver o circo pegar fogo”
“O Amapá só aparece quando tem desgraça”
“As coisas não são como o Fantástico mostrou”
“A reportagem é mentirosa”
Enfim, nos últimos dias essas e outras barbaridades foram usadas em profusão nos programas “radiofônicos” matinais. Muita gente que se deixou levar pelos “sofistas de aluguel” ficou convencida de que realmente o Fantástico exagerou. E que o problema não é tão feio como o “Diabo” mostrou. Entretanto, eles não completam os argumentos porque obrigatoriamente teriam de explicar que a maternidade não é reformada, que seus equipamentos são arcaicos, que faltam médicos e medicamentos porque a corrupção deslavada grassou livremente no subsolo da Secretaria de Estado da Saúde do Amapá (Sesa), resultando no desvio de mais de R$ 40 milhões. E que essa pilhagem se alastrou de 2003 até os dias atuais.
E ninguém escapou. Por exemplo, cerca de dois anos atrás um enorme escândalo foi abafado quando aterrizou na mesa de um conselheiro do TCE o resultado de ampla auditoria contábil realizada nos porões da Secretaria de Estado da Saúde do Amapá. Foi descoberto que o sobrinho de uma alta autoridade do Estado tinha participado de uma licitação para imprimir material gráfico para a Sesa (cartazes, folhetos, manuais, folders, etc.) com três firmas localizadas no mesmo endereço, em Belém (PA). E ele vinha faturando, de forma fraudulenta, milhares de reais. Imaginem o que aconteceu?
Exatamente, meu caro/minha cara! Por isso, alguns radialistas/jornalistas ou jornalistas/radialistas (tanto faz, tanto fez) não completam os argumentos. E por que?Simples: estão comprometidos até a “planta” do pé. E quando a Imprensa (mesmo que seja uma minúscula parte dela) curva-se ao manda-chuva de plantão, qualquer que seja ele, quem sofre as consequências de tamanho servilismo é a população de média e baixa rendas cujo acesso à informação, às vezes, está restrito somente às mídias rádio e televisão.
Quer um exemplo de silogismo erístico? Leia, novamente, a NOTA DE ESCLARECIMENTO emitida pela Sesa na segunda-feira, 3 de maio. Na terça-feira de manhã quase todos os programas de rádio a repercutiram sem qualquer debate sobre seu teor altamente duvidoso.
“NOTA DE ESCLARECIMENTO
Sobre a reportagem veiculada no programa Fantástico, da Rede Globo de Televisão, no último domingo, envolvendo a Maternidade do Hospital da Mulher Mãe Luzia, a Secretaria de Estado da Saúde (Sesa) esclarece o seguinte:
A Maternidade Mãe Luzia é a única unidade de referência em ginecologia e obstetrícia no Amapá, atendendo 700 mil habitantes do Amapá emais de 200 mil pessoas oriundas de comunidades ribeirinhas paraenses. Nesta condição, enfrenta problemas de excesso de demanda, com seus conseqüentes problemas;
A reportagem menciona que a taxa de óbitos neonatais da maternidade é cinco vezes superior à média nacional. A comparação é falsa, visto que a Maternidade Mãe Luzia trabalha com partos de médio e alto risco, enquanto a média nacional envolve partos de baixo risco;
Dados do Departamento de Estatística da Maternidade Mãe Luzia, desde o ano 2000, mostram que a taxa de mortalidade neonatal tem decaído consideravelmente no Estado do Amapá, apesar do aumento da demanda;
A Secretaria de Saúde está fazendo adequações no Plano Diretor do Hospital da Mulher, com o objetivo de aumentar o número de leitos da Maternidade;
Visando suprir a demanda crescente, o Governo do Estado assinou recentemente convênio com a Prefeitura de Macapá, para garantir a retomada das obras do Hospital Regional, que terá 36 leitos de maternidade, que suprirão a demanda da Zona Norte;
O projeto de um novo hospital, que abrigará uma ala com capacidade para 126 leitos de maternidade, já está concluído. Ele será financiado com recursos do BNDES, e aguarda aprovação do Legislativo estadual;
A Sesa reafirma seu compromisso com os usuários do SUS no Amapá e, nesta condição, repudia qualquer politização relacionada à saúde pública amapaense”.
Leia, em seguida, matéria veiculada pela Agência Folha:
Ministério Público investiga 57 mortes de bebês em maternidade de Macapá
04/05/2010 – 15h10
da Folha Online
A única maternidade pública de Macapá, Mãe Luzia, registra 57 mortes de bebês entre os 1.755 que nasceram este ano. O Ministério Público do Amapá investiga a situação do local que atende 16 municípios do Estado, além de oito do Pará, mas conta com somente sete leitos de UTI (Unidade de Terapia Intensiva) com respiradores artificiais.
Segundo o diretor da maternidade, Dílson Ferreira da Silva, o hospital tem um alto índice de mortalidade de bebês com até um mês de idade porque recebe muitas mães jovens que não fazem o pré-natal. “Temos um alto índice de gravidez precoce, de meninas de até 13 anos e muitas não fazem o pré-natal. Em consequência disso, elas desenvolvem alguma complicação que leva à prematuridade extrema dos bebês.”
De acordo com ele, outra causa para o elevado índice de óbitos é que a unidade atende casos de extrema complexidade. “Somos uma unidade de referência para atendimento pelo SUS [Sistema Único de Saúde] e a única do estado que faz procedimentos de alto e médio risco”, destaca.
Só este ano a taxa de mortalidade na Maternidade Mãe Luzia chegou a 32 bebês em cada mil nascidos. Em 2009, o índice verificado em todo o estado do Amapá foi de 16,6, pouco acima da média nacional, de 13,9, segundo dados do Ministério da Saúde. Só entre os dias 5 e 8 de fevereiro, nove bebês morreram no hospital.
A gravidade da situação levou um grupo de mães de Macapá a procurar a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) no Amapá. A entidade encaminhou a denúncia ao Ministério Público do estado, que pediu a abertura de inquérito policial e investiga a situação da maternidade. “Inicialmente queremos que a situação seja resolvida rapidamente para depois responsabilizarmos os culpados”, afirma o promotor Alb erto Eli Pinheiro.
Para ele, o problema de falta de médicos e infraestrutura não ocorre somente na Maternidade Mãe Luzia. “A saúde do Amapá em geral está muito precária. Faltam, principalmente, médicos porque o estado não forma profissionais suficientes e temos que esperar que eles venham de fora.”
Segundo o Ministério da Saúde, até o início da manhã desta terça-feira não houve registro de pedido de intervenção federal na saúde do Amapá. A assessoria de imprensa da pasta informou que no ano passado foram repassados R$ 66,8 milhões para investimentos em ações de alta e média complexidade no estado. Segundo o ministério, o valor representa um salto de 4.475% se comparado à verba de R$ 1,46 milhão repassada em 2002. A pasta informou ainda que esse aumento foi 18 vezes maior para o Amapá em relação aos demais Estados.
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